quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

10.


Das fantasias românticas, e das moléstias inevitáveis


Os apaixonados, coitados, vivem num mundo à parte: o mundo da Lua.
Talvez seja por isso que a Lua tenha exercido tanto fascínio sobre os apaixonados – como consta na vasta literatura romântica do passado, principalmente a dos séculos XVII a XIX. Ela, feminina (passiva), é cortejada pelo Sol (ativo); e o responde com o seu embriagante prateado: refletindo-o. Ele, sobre ela, qual amante enamorado, despeja sua semente (sêmen) fecundante; e ela devolve a sua luz, correspondendo-o, recíproca. É uma metáfora para o amor romântico, sem dúvida. Vontade, fecundidade, submissão.
Hoje, nas grandes cidades, a fumaça, a poeira, os grandes prédios e as luzes artificias fazem fugir o céu, escondendo-o, e Lua. Mas o romantismo antigo, ilustrado por um luar hora dourado, hora prateado, ainda existe. Noutros tempos, porém, isso era mais evidente; bem mais evidente.
Minha mãe, a propósito do afirmado, dizia que meu pai, dentre as muitas promessas que fizera antes de seduzi-la, prometeu-lhe, se fosse aceito como amante, dar-lhe o céu, a Lua e, de bônus, as estrelas e as constelações. A ingênua e romântica Almilinda, nada entendendo de astronomia, acatou a descabida proposta.
Mas a única coisa que meu pai lhe deu, realmente, foram dois filhos – e eu fui o segundo deles. Depois veio o desprezo, as traições e, como saldo, a solidão de muitas e muitas noites incrivelmente longas, e frias, e escuras. “Amor é sofrimento, é descontentamento”, dizia a Adélia. E Renato Russo, na letra de “Longe do meu lado” (música em ré menor, no álbum: “A Tempestade ou O Livro dos Dias”, da Legião Urbana), tem certeza: “A paixão quer sangue e corações arruinados...”
Mas, ai de quem tenta dar conselhos aos apaixonados!
É que eles, em relação à frieza da razão, nada podem entender; nada querem entender. Doentes que estão, têm a mente obnubilada pelos efeitos fortíssimos desta moléstia contagiante: o amor novinho – toda paixão é um amor novinho; se ela progride ou não, é outro departamento. Por isso, eles somente entendem o que querem entender, somente ouvem o que desejam ouvir. A paixão, porém, é como resfriado: se não virar bronquite, passa.


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