quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

22.


Contra a idéia de uma “verdade histórica”


Todo mundo sabe que Platão não simpatizava muito com a(s) arte(s), e a escultura em particular – por julgá-la inferior, uma vez que era mero simulacro do Real. Mas, há mesmo o Real, a Verdade? Há, por exemplo, uma verdade histórica?

Como nas artes, também na narrativa histórica, tudo parece não ser mais que simulacro – perspectiva de quem narra o fato, e conforme o percebe através de tantas lentes, sempre muito pessoais e fundamentadas em experiências e leituras próprias do Mundo. Mas o “simulacro de verdade, não [é] verdade”, diz José Américo Motta Pessanha, em História e ficção: o sono e a vigília, de 1987. O mais certo, conforme a lógica mais lógica, pode não ser mais que “o sonho mais profundo e mais perverso”. A crítica de Pessanha é à história que pretende-se História, histórica, e, logo, verdadeira, descrição fiel dos fatos reais. Daí as aproximações antagônicas entre invenção/verdade, ou sono/vigília, como no elogiado texto de Pessanha. O discurso nunca é, ou deve ser, fechado, mas sempre aberto à reinvenção. Dizer a “verdade” é dizer uma palavra que não se encerra em si mesma, pois sempre aponta para “aquilo” que ela mesma não contém – é sinal, mas, sinal de quê? –; como na celeuma dos universais, é flatus vocis. Tanto na história quanto na(s) arte(s), há uma dinâmica permanente que é distância e proximidade; pois invenção a inventar-se – como dizia Walter Benjamim, tratando sobre a história e o historiador: “O narrador”, diz, “conta o que ele extrai da experiência – sua própria ou aquela contada por outros. E de volta, ele a torna experiência daqueles que ouvem a sua história”. E é nesse processo do devir, devindo, que a história se perde e se encontra, na experiência individual e no efeito da sua transmissão. Será possível a verdade? Será preciso a verdade? Parece que, afinal, vivemos muito bem sem ela, criando-a conforme nossas necessidades temporais.


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