23.
De toda a esperança que habita um "não"
Angélica, dois ou três meses depois que Alberto largou da mulher, praticamente colou nele, insistindo em mantê-lo por perto, como, antes, não podia. E mandava e-mails, recados pelo celular, e ligava tarde da noite, e ia ao trabalho dele com as desculpas mais ingênuas que se possa imaginar, e sem fazer qualquer força para esconder as intenções, as investidas. Alberto, porém, cheio de medos de encarar uma nova relação, depois dos traumas da anterior, não conseguia decidir se preferia – ao menos por enquanto – Angélica ou a solidão. Talvez se arriscasse a uns casos mais leves, fortuitos, sem aqueles compromissos que são adquiridos quando se gosta de alguém, com sentimentos. É!, talvez pudesse ser assim, pensava. Pelo menos até que tivesse alguma certeza sobre o que realmente queria. Mas o coração humano é terra estranha e, por ele, andamos em caminhos escuros e sinuosos, mal sinalizados.
Resultado da insistência de Angélica, Alberto começou a observá-la com alguma complacência, olhando-a de modo carinhoso, como ela, a ele, parecia olhar. Lástima! Quando finalmente decidiu que ia ter uma conversa definitiva com ela, e que queria levá-la mais a sério, e assumir o que sentia, ela lhe disse que, agora, estava com algumas dúvidas sobre “essa nossa relação”, e “eu preciso de um tempo só para mim.”
E deixou de ligar, de mandar e-mails, de aparecer no trabalho de Alberto. Sumiu. Ele, sem entender o motivo de tão repentina mudança, decidiu “fechar o coração para balanço”, como há tempos vinha querendo fazer. O que teria ocorrido para que a louca mudasse tanto, do vinho à água? Perguntava. A resposta, ninguém sabia; nem ele.
“Meu Deus!”, disse-me outro dia, narrando o fato aqui descrito, sem floreios nem iluminuras, “quanta frescura!, quanta putaria! Rapaz, deveria existir uma lei contra essas coisas, viu? Tomar no cu!”
* * * * *
Moral da história: “A esperança de um destino nunca é tão forte quanto em nossa vida amorosa.” (BOTTON, Alain de. Petite philosophie de l’amour. Paris: DENOËL, 1997. p. 7).