32.
Da indignação pelo excêntrico ser definido
– Olha! Vê logo! Faz um pedido!
Ele olhou, meio displicente. Era um céu comum, como aquele das aquarelas de Luyse; e não havia nenhum deus ali, e nem depois. Era um céu de literatura, mas não da poética, que mente sobre as coisas do mundo e do além-mundo, louvando a excentricidade dos seres definidos: anjos, diabos, deuses, milagres. Não!, ele sabia, não havia milagre nenhum. E, no entanto, estava admirado. Admirado com o brilho nos olhos dela, e a sua empolgação radiante com a estrela que caía. Que merda!, pensou. Estou fodido! Estou apaixonado!
– É lindo, não é?
– É sim. – Ele disse, de olhos fixos nos olhos dela, que miravam o encarvoado e frio céu de Agosto.
– E então?
– Então, o quê?
– Ora, o quê? – ela o estapeou, mas sem violência. – O que você pediu? Faaalaaa...
– Ah!, eu pedi... – fez mistério, como se não fosse falar o que ela queria ouvir. Mas nada disse, esperando ver a sua reação.
– Falaaaaaa... – ela reclamou, estendendo o “a” como era de costume, e simulando novo ataque ao seu peito, com os punhos fechados e a cara de raiva, de mentirinha. Ele adorava aquilo. E, entre o riso e o pesar, disse, de olhos nos olhos dela:
– Pedi uma coisa que, para ser alcançada, não depende mais de nós dois... e nem de nada.
Olhando-o, ela não entendia o que ele queria dizer com aquilo, e com tanta gravidade, e tanta subjetividade besta. É claro que nem ela e nem ele, muito menos ele, levavam essa história de “estrela cadente” a sério? Ele, racional, racionalista, deveria estar de provocação. Só podia! Mas ela insistiria:
– Vaaai... contaaaa, amorrrr.... O que foi que tu pediu?
– Ok!, eu digo. Pedi para que você tenha sempre essa alegria, e esse brilho lindo nos olhos, e continue pensando em mim quando, um dia, a minha estrela se apagar.
Um frio passou por sua espinha. Que exagerado! O besta. É, que exagerado. Se queria dizer que lhe amava, que dissesse de uma vez, ora! Ela riu, pensando nisso, e também achou bonito que ele fosse assim; e não tinha o que lhe dizer. E não disse nada.
Dois meses depois, no cemitério, sentada no banco de mármore que ficava em frente ao túmulo dele, ela recapitulava tudo isso, e entendia perfeitamente o que ela havia lhe dito: “que você continue pensando em mim quando, um dia, a minha estrela se apagar”, palavra por palavra. “... cada estrela parecerá uma lágrima...”, sussurrou baixinho, cantando para si, numa tristeza desafinada, enquanto caminhava em direção ao carro. Voltaria para casa, para a sua solidão de mil vidas passadas. O apartamento, que era tão pequeno, agora tinha as dimensões da Via-Láctea, de uma galáxia inteira.
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Moral da história: se você tem um amor ou um sorriso guardado para alguém, use logo.