quarta-feira, 6 de julho de 2011

30.


O irresistível peso de tudo


Um homem equilibrado, conforme a sentença latina, é aquele que tem uma mente sã em um corpo são (Mens sana in corpore sano). Tal homem bem-aventurado, se existisse, seria o mesmo que um deus. Mas os deuses, que lástima!, não existem! Se existissem, porém, seriam infinitamente infelizes por reterem tanto poder; seriam tão infelizes que desejariam a feliz miséria dos homens: que são cegos aos seus destinos; que odeiam seus pares; que amam seus objetos desejados; que sentem o peso do corpo, o indisfarçável peso do mundo; e envelhecem, e não sabem dormir com fome, e têm pesadelos pelo excesso de saciedade. Sim!, quem dorme primeiro é a mente. O corpo, que nada é, obedece. Mas o corpo, à mente, pesa demais; insuportavelmente demais. E daí as insônias e a invenção das canções e dos poemas; e daí os tantos livros e a arte em geral; e daí a angústia universal que não cabe em nenhum livro de história, mas está em todos: todos os livros sobre tudo e sobre todas as coisas; todos, todas.
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......Suz Tzu dizia que “a suprema arte da guerra é derrotar o inimigo sem lutar”. Mas, para se ter uma tão boa estratégia, há que se lutar contra as más. Heráclito, menos “sábio chinês”, dizia que “tudo é luta!”, e Sêneca, séculos depois, sentenciava: “Viver significa lutar.” No Ocidente – e no Oriente, na prática mais comum do dia-a-dia das pessoas comuns –, Heráclito e Sêneca (e praticamente todos os filósofos) prevaleceram. Oh, sim!
......Heráclito, coberto de razão... e depois de estrume – conforme seus pouquíssimos e confiáveis biógrafos. Viver é penoso! Morrer, também. Quer um equilíbrio? Equilibre-se aí, na resistência ao irresistível peso de tudo. Sábio, por fim, é aquele ou aquela que está no meio, entre o isto e o aquilo, rindo e troçando entre os dois abismos.


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