segunda-feira, 23 de abril de 2012


60.






De quando a flor tem um nome




Dizem que ele andava apaixonado e, pelo campo, antes de chegar à casa da moça, colheu as flores que lhe daria.
Era um dia de sol claro e bom, e a terra parecia respirar sossegada das guerras, da fome e das tristezas que assolam os continentes. Tudo estava em seu lugar, como deveria sempre ser.
Ele nem chegou à varanda e ela, vendo-o, saiu correndo para encontrá-lo, apressada em obedecer aos impulsos do seu coração enamorado; rindo feliz à luz do dia azul e ao sopro leve de uma brisa primaveril muito perfumada.
Ele escondeu o ramalhete de flores atrás de si e esperou que ela lhe alcançasse, hipnotizado com a sua beleza, olhando-a deslizar sobre a relva respingada de belas-emílias. Ela notou seu gracejo apaixonado e parou no meio do caminho, para que ele também fosse ao seu encontro e, enfim, pudessem trocar abraços e beijos, e passear pelo campo.
Vencido pelo desejo, ele atendeu à sua solicitação silenciosa, e mais que depressa saiu ao encontro dela, que era a flor mais linda de todas aquelas paragens. Mas...
... nem ao menos deu sete passos e, infeliz, sentiu o chão ceder sob seus pés, despencando na ribanceira amolecida nas águas do rio que ficava entre o bosque e a casa dela. Agarrou-se como pode em uma raiz protuberante, mas a correnteza o arrastava. Não conseguia largar o ramalhete de flores que era dela, que correu para ajudá-lo, mas sem nada poder fazer. Aos prantos, gritou por socorro; mas os homens haviam saído ou para o campo ou para a cidade, e a sua velha mãe não poderia fazer nada, infelizmente. Ele pediu que ela agarrasse as flores que ele iria jogar. Assim, dizia, poderia ficar com a mão livre e, se Deus a ajudasse, sair a salvo dali. Quando tomou impulso para lançar as flores, coisa que conseguiu, a pequenina raiz em que ele agarra-se partiu. Com as flores nas mãos, e chorando, ela ouviu quando ele implorou:
Vergis mein nitcht...
... que, na língua do moço, em alemão, queria dizer: “não te esqueças de mim”.
Sem conseguir ouvir direito, pelo barulho das águas e pelo canto feliz dos passarinhos, ela pensou ter ouvido apenas “miosótis”, e julgou que ele dizia o nome das flores que lhe presenteara. Nunca mais veria o rosto alegre do seu amado..  
* * * * *
E é por isso que até hoje, e mesmo que a moça não tenha compreendido, o miosótis é conhecido como “não-te-esqueças-de-mim”, ou “não-me-esqueças”. Além de ser recomendado contra a depressão pós-parto, e àqueles que tenham perdido o gosto pela vida, ou um ente querido que se foi e que jamais voltará.




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