Romantismo, idealismo e inconsciente
1.
A Volúpia (voluptas) fantasia-se de amor romântico, porque o uso limpo dos órgãos reprodutores não é romântico, e nem bonito. Entram aí os mecanismos da conquista, e o romantismo que, fundamentado no idealismo, faz com que alguns, em suas cândidas demonstrações de amor – ou a procura de um amor ainda não tão “demonstrado candidamente” –, dêem flores. Uma rosa, quando oferecida, é um convite ao coito, à procriação. A rosa – ou outra flor qualquer que seja mais que um botão, e ainda o próprio – é a figura simbólica da vulva que, como a flor, é potencialmente fértil de frutos e de vida.
“Por muito desinteressada e ideal que possa parecer a admiração por uma pessoa amada, o alvo final é na realidade a criação de um novo ser [...]. Que uma criança seja gerada, é esse o alvo único, verdadeiro, de todo romance de amor, embora os namorados não dêem por isso: a intriga que conduz ao desenlace é coisa acessória”.
2.
Ora, “para atingir o seu fim”, que é a geração de um novo indivíduo, é “necessário que a natureza engane o indivíduo com alguma ilusão”. E a ilusão é promessa de uma felicidade, de um prazer sem dor. Mas isso não pode ser assim. Tanto não pode que, Léon Bloy, numa crítica ácida a Musset, diz: “‘Quero amar, mas não quero sofrer’, põe imbecilmente na boca de uma de suas heroínas, o imbecil Alfred de Musset.’ (‘E.’ – II, p. 90).” Prazer (voluptas) e dor (dolon) são os dois tons que formam o acorde chamado “emoção” (affectus, ou passio). Como reza a tradição filosófica, principalmente a epicurista, o prazer nem sempre pode ser associado à felicidade (eudimonía, felicitas). O prazer está mais ligado à condição temporal de satisfação, ao passo em que a felicitas, pelo menos no seu sentido mais profundo, diz respeito a uma satisfação plena, duradoura, que deseja-se eterna – como aquela que Santo Agostinho disserta no seu De beata uita. Mas, em Schopenhauer: “Todas as paixões amorosas da geração presente não são, portanto, para a humanidade inteira, senão a séria meditatio compositionis futuræ, e qua iterum pendent innumeræ generationis. [...] É sobre este grande interesse que repousam o patético e o sublime do amor, os seus transportes, as suas dores infinitas que os poetas há muitos séculos não se cansam de representar em exemplos sem número”.