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Do bendito prêmio das Musas
A alguns dos mais sábios, e a alguns dos melhores poetas e artistas, o excelente prêmio das Musas é a loucura – que lhes preserva e protege do inferno da consciência, fazendo com que a Morte, o maior de todos os males, seja encarada frente a frente, sem medos. Bela dama adornada para a festa do eterno silêncio. Foi assim com Heráclito de Éfeso, com Friedrich Nietzsche, Emily Dickinson, Van Gogh, Guy de Maupassant, Edgar Allan Poe, William Blake, Antonin Artaud, Friedrich Hölderlin, Gérard de Nerval, Goya, Arthur Bispo do Rosário, e outros. Também a Loucura, personificada, pode ser a voz da razão: a única razão razoável – à qual submete homens e deuses, como afirmado pela mesma nos inícios d’O elogio da loucura (1509), de Erasmo de Roterdã: “Digam de mim tudo quanto queiram (pois não ignoro como difamam a loucura até os que mais são loucos), eu, eu somente é que, pela minha influência divina, mergulho na alegria deuses e homens.” Sem o prêmio das Musas, no qual a “realidade” poderia ser encarada como simples “conceito”, contra a “realidade concreta”, Aldous Huxley, em Wanted, a new pleasure (music at nigth), propôs “uma droga, que seja um substituto mais eficiente e menos prejudicial do que o álcool e a cocaína, [para fazer o paraíso] acessível sempre que necessário.” Assim, e instantes antes de morrer, e sem poder falar, escreveu em um papel, para que sua mulher (Maria Huxley) providenciasse “LSD, 100 mg, intramuscular”. A experiência final deveria ser positiva, na alucinação que transpõe o estado apolíneo. Autêntico salto de fé na irracionalidade – um modo artificial de cortejar a loucura. Morreria às 17:21 do dia 22 de novembro de 1963, aos 69 anos. Enlouquecer no final – um ideal sublime.