segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

13.


O lugar da metafísica, e da teologia


Kant perguntava o porquê de a metafísica não apresentar o mesmo grau de certeza da lógica, ou da matemática, ou da física. Acontece que, alcançando tais graus de objetividade, a metafísica não seria mais metafísica, seria mais uma ciência natural. Impossível! O próprio Kant, seguindo David Hume, procura mostrar que a idéia de Deus, embora esteja bem instalada em nossas mentes, não pode servir de ponte para a realidade objetiva. Deus é assunto da fé, não da objetividade. É evidente que, assim, a metafísica (ou a teologia) nunca poderia progredir, e o discurso sobre Deus, sobre a imortalidade da alma, sobre a liberdade do homem (uma moral fundante-fundamental) ou sobre o extramundano, nunca teria um termo, um lastro concorde entre os próprios metafísicos, ou teólogos. Todo o progresso metafísico-teológico está em descobrir e utilizar os novos mecanismos hermenêuticos – adequando-os às necessidades de cada época, regrando tudo pela Escritura, ou pela sua interpretação –; mas, tais mecanismos, sempre servem para justificar o que já se crê – algo que fica bem longe do que se possa chamar programa (ou método) objetivo-científico. Não há uma ciência, e menos ainda argumentos – como o ontológico, conforme encontrado em Anselmo de Aosta e Descartes, as Cinco Vias, de Tomás de Aquino, ou o argumento do desígnio, de William Paley, por exemplos – que sirvam para provar ou negar que Deus exista. A “existência” material não pode ser, de modo algum, parte do que se possa querer definir por “idéia de...”. Se Deus existe mesmo, como querem os que têm fé, ele seria totalmente outro que esse das teologias, ou totalmente outro desse que digo “ser, ele”, embora não o diga, de fato. É que Deus, caso seja, está tão longe de ser pensado que o melhor discurso sobre ele só poderá ser mesmo aquele das teologias negativas, apofáticas, como no “discurso não-discursivo” do taoísmo, ou sobre o Tao... Sim: o que o imperfeito saberia sobre perfeição? A pergunta, como se vê, é um paradoxo; um paradoxo antigo e inevitável. Acontece que o fato de o pensamento saber (ou notar) da imperfeição do/no mundo, não garante em nada que saiba do que venha a ser sua contraparte... o “perfeito”, o perfeito extramundano. É também uma “conclusão” antiga, mas válida ainda. Muito válida! Não há uma única teologia que, de fato, faça jus ao nome: “discurso sobre Deus, acerca de Deus”. A não ser que se saia dos limites da experiência, o que seria ilícito em relação à razão, não é justo adequar qualquer finalidade conclusiva em referência a um ser superior. A metafísica, no entanto, ultrapassa todas essas limitações inerentes ao conhecimento – é o que Kant mostra na “Estética” e na “Analítica transcendentais” –, afirmando saberes completamente fora de qualquer legitimidade: seja quando aplica categorias a priori do entendimento além dos limites da intuição sensível (os juízos sintéticos com os quais ela se arma são falsos, pois não são mais que sínteses no vazio), seja quando pretende conhecer a coisa-em-si, o objeto puro (o que é uma contradição: conhecer, em si, é transformar a própria coisa-em-si em fenômeno, aparência). De fato: a melhor teologia ou o melhor discurso sobre Deus é o não-discurso, a não-teologia... o silêncio. No mais, e para todas as pretensões metafísico-teológico-discursivas: teopoesia.


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