quarta-feira, 5 de setembro de 2012


16.





De como Ghiraldelli não explica nada sobre o amor (Parte 1)



 “Antes de alguma palestra, enquanto se espera dar a hora exata do início do evento, é comum as pessoas formarem grupinhos de conversação ao redor do palestrante. Eu estava em uma roda de bate-papo desse tipo, na universidade. No centro dela, o padre convidado a falar também aguardava o momento, mas ali mesmo já havia começado a aquecer a garganta. Dava suas opiniões sobre tudo, falando pelos cotovelos, e, como de praxe, tecia comentários doutorais a respeito do amor. Foi então que o meu celular chamou. O toque não era tradicional, mas aquele com sons diferentes. No caso, tratava-se dos ruídos característicos de uma moça fazendo amor, que alguém em casa havia colocado como ‘chamada’! Eis que o constrangimento foi geral. E piorou quando eu, tentando consertar a situação, comentei que aquilo era o que de fato era mesmo: ‘gemidos de amor’. Saí logo da roda para atender à chamada e, evidentemente, não voltei.
“Interessante esse fato: falávamos de amor, mas os gemidos de amor não foram bem-vindos!”1

É o primeiro parágrafo e início do segundo, no capítulo 1 de Como a filosofia pode explicar o amor (Universo dos Livros, 2011), do professor Paulo Ghiraldelli Jr. E essa é a melhor parte do referido livro – por, e com graça, mostrar o contraste entre o ideal (o amor romântico, sublimado, no discurso “piedoso” do padre) e o real (os gemidos do sexo sendo feito, sem piedade alguma).
Erra-se, e erra-se muito – e o próprio Ghiraldelli não será isento a isso, em seu livro2 – quando se faz a distinção entre uma coisa e outra, ou quando confundem esse amor como derivação daquele Outro, como se o ideal, sublime, sublimado, tivesse uma existência própria, extramundana, e não somente em nós mesmos, em nossos delírios e vontades inconscientes. No amor e na guerra, e sem tal delírio, nada é lindo, nada é sublime, nada é encantado; tudo é fome e destruição.






1 GHIRALDELLI JR., Paulo. Como a filosofia pode explicar o amor. São Paulo: Universo dos Livros, 2011. p. 7. (Col. Filosofia Prática).
2 Que, por sinal, faz parte de uma coleção intitulada “filosofia prática”, da editora supracitada. Olhando-se a fundo, porém, e pela mera repetição do autor às concepções ultrapassadas e teóricas, subscrevendo-as, a “praticidade”, aí, auxilia apenas à manutenção do romantismo – fonte de lucros garantidos ao mercado editorial, à indústria cinematográfica e musical, dentre as mais representativas, nas artes – e do equívoco milenar, desde Platão até os dias de hoje. Minha crítica, sobre a obra, aparecerá no diálogo a seguir.  


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