16.
De como Ghiraldelli não explica
nada sobre o amor (Parte 1)
“Antes de alguma palestra,
enquanto se espera dar a hora exata do início do evento, é comum as pessoas
formarem grupinhos de conversação ao redor do palestrante. Eu estava em uma
roda de bate-papo desse tipo, na universidade. No centro dela, o padre
convidado a falar também aguardava o momento, mas ali mesmo já havia começado a
aquecer a garganta. Dava suas opiniões sobre tudo, falando pelos cotovelos, e,
como de praxe, tecia comentários doutorais a respeito do amor. Foi então que o
meu celular chamou. O toque não era tradicional, mas aquele com sons
diferentes. No caso, tratava-se dos ruídos característicos de uma moça fazendo
amor, que alguém em casa havia colocado como ‘chamada’! Eis que o
constrangimento foi geral. E piorou quando eu, tentando consertar a situação,
comentei que aquilo era o que de fato era mesmo: ‘gemidos de amor’. Saí logo da
roda para atender à chamada e, evidentemente, não voltei.
“Interessante esse fato: falávamos de amor, mas os gemidos de amor não
foram bem-vindos!”1
É o primeiro parágrafo e início do segundo, no capítulo 1 de Como a filosofia pode explicar o amor (Universo dos Livros, 2011), do
professor Paulo Ghiraldelli Jr. E essa é a melhor parte do referido livro – por,
e com graça, mostrar o contraste entre o ideal (o amor romântico, sublimado, no
discurso “piedoso” do padre) e o real (os gemidos do sexo sendo feito, sem
piedade alguma).
Erra-se, e erra-se muito – e o próprio Ghiraldelli não será isento a
isso, em seu livro2 – quando se faz a distinção
entre uma coisa e outra, ou quando confundem esse amor como derivação daquele
Outro, como se o ideal, sublime, sublimado, tivesse uma existência própria,
extramundana, e não somente em nós mesmos, em nossos delírios e vontades
inconscientes. No amor e na guerra, e sem tal delírio, nada é lindo, nada é
sublime, nada é encantado; tudo é fome e destruição.
1 GHIRALDELLI
JR., Paulo. Como a filosofia pode
explicar o amor. São Paulo: Universo dos Livros, 2011. p. 7. (Col.
Filosofia Prática).
2 Que, por
sinal, faz parte de uma coleção intitulada “filosofia prática”, da editora
supracitada. Olhando-se a fundo, porém, e pela mera repetição do autor às concepções ultrapassadas e teóricas, subscrevendo-as, a “praticidade”, aí,
auxilia apenas à manutenção do romantismo – fonte de lucros garantidos ao
mercado editorial, à indústria cinematográfica e musical, dentre as mais
representativas, nas artes – e do equívoco milenar, desde Platão até os dias de
hoje. Minha crítica, sobre a obra, aparecerá no diálogo a seguir.