Escousses exegético-psicológicos
25.
Das máscaras da civilidade ocidental
A civilização ocidental, desde muito, escondeu-se sob duas máscaras: Deus e a “pessoa humana”. Maquiou assim, com algum sucesso, o cru e o vazio que é a barbárie do humano limpo, o si-mesmo (o autêntico que não é si-mesmo senão como inautêntico); na negação artificial de ser aquilo que se é, e, eo ipso, sendo não-si-mesmo – situação (mesmo quando posicionamento inconsciente) existencial que passa a ser o seu estado mais “puro” e “natural”. Nada mais verdadeiro e revelador que a máxima de Plauto (proferida duzentos anos antes de Cristo), popularizada depois por Hobbes, no Leviatã (publicado em 1651), tratando sobre o homem em seu estado natural, sem Lei: homo homini lupus. Nada mais mentiroso e dissimulado que a máxima cartesiana: “O bom senso é a coisa melhor partilhada entre os homens”. O contrário é bem verdadeiro. Heidegger apoia Hobbes, e opõe-se à Descartes, quando fala do Eu inautêntico, dizendo que “Ninguém é si-mesmo”. Sim: somos o resultado das convenções seculares, dos muitos olhos que nos indicam as melhores vias, e nos vigiam, previnem, punem; e somos, não por fim, o que deixamos que nos façam os governos e/ou a fé majoritária do grupo onde estamos lançados. Essa inautenticidade é o que, sob todas as formas, foi nomeada como “civilização”, “civilidade” – e assim o círculo se fechou (ou foi sendo fechado, aos ditames da irracionalidade cega de consciências menores, submissas à Vontade, sem um senso crítico acerca da espontaneidade da vida e/ou da inevitabilidade da morte como... simul finis) –, na representação tola do progresso: esse grande embuste da inteligência superior, da animalidade pseudo-domada. É por isso que o “amor” – a palavra mais doce e mentirosa dessa “civilização” construída, inventada –, principalmente à ocidentalidade platônico-aristotélico-cristã, precisa ser constantemente re-definido, re-vivido, re-inventado. Dai nascem todas as guerras, todas as religiões e, ipso facto, todas as mentiras de progressos e finais felizes.